arrendar a casa

Mercado imobiliário - outra vida

Em 2014, os preços das casas sobem pela primeira vez desde a entrada da troika em Portugal. O mercado imobiliário ganha dinamismo e a reabilitação entra em cena. A recuperação está aí?

O apartamento erguia-se sobre a Avenida de Roma. O chão de madeira corrido, os azulejos antigos, e as memórias daquele lugar faziam-lhe lembrar a infância. Ana, de 55 anos, tinha nascido naquela zona de Lisboa, mas mudara-se há cinco anos e meio para Macau, onde era assessora do turismo da região.

Não pensava para já em regressar, mas como muitos outros investidores – portugueses e, sobretudo, estrangeiros – decidiu que esta era a altura certa para comprar casa em Lisboa. “As casas baixaram bastante de preço em relação a quando vivia [em Portugal], e esta zona antigamente era demasiado cara para o meu orçamento”, contou ao Observador. “Por outro lado, pensei que seria mais rentável aplicar o dinheiro que tinha em imobiliário do que nos juros praticamente nulos dos bancos.”

Nos primeiros três meses de 2015, as transações de alojamentos já subiram mais 38,3% do que no mesmo período de 2014. E, no ano passado, pela primeira vez desde a entrada da troika em Portugal, os preços das casas entraram em ascensão. Os responsáveis?Reabilitação urbanavistos Gold, regime dos residentes não-habituais e turismo residencial de curto prazo. Com o virar do ano, a tendência intensificou-se e, como Ana, chegaram muitos mais investidores.

“Vamos arrendar a casa e, se voltarmos para Portugal, iremos para lá viver. Gostaríamos de a arrendar na modalidade de curto prazo, mas como estamos longe é difícil, por isso optámos pelo arrendamento clássico”, afirmou Ana, que decidiu encarregar-se das obras do apartamento na Avenida de Roma.

Chegou o momento da reabilitação urbana: “As pessoas estão a voltar às cidades”

Se 2014 ficou marcado pela recuperação dos preços das casas, tendo os imóveis no final do ano ficado – pela primeira vez em três anos – mais caros do que no inicio, em 2015 o mercado imobiliário ganhou um novo dinamismo. Entre janeiro e março, o total de imóveis transacionados registou a maior variação desde 2010 e 78,4% correspondeu a casas usadas. As vendas deste tipo de imóveis já cresceu 46,7% desde o final de 2014, revelou o INE. Já as transações de imóveis novos aumentaram 14,6% no mesmo período.

Para Carlos Vasconcellos, antigo líder executivo da PT Comunicações e atual presidente e fundador da Quantico – uma empresa líder de mercado em investimentos na área da reabilitação urbana em Portugal – é mesmo a recuperação de casas antigas nos centros históricos de Lisboa e Porto que está na base do novo impulso do mercado imobiliário.

“O espaço para novas construções é muito reduzido e, nas zonas históricas, está a haver um retorno. Se antigamente as pessoas iam para os subúrbios, agora estão a voltar às cidades. Os centros urbanos estão mais inteligentes em termos de transportes públicos, em termos de energia e agora as pessoas vêm de fora das cidades para os centros históricos para irem ao ginásio, para ver um concerto. E a única forma de vir efetivamente para o centro é reabilitando-o. Isto já se faz sentir em Lisboa e também começa agora a notar-se muito no Porto. Há um novo modo de vida diferente que está a puxar pela reabilitação”, explica o fundador da Quantico ao Observador.

No primeiro trimestre de 2015, na Área Metropolitana de Lisboa e nos Açores, o número de pedidos para obras de reabilitação cresceu respetivamente 30,4% e 43,2%, desde o mesmo trimestre do ano passado, refere o INE.

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Reabilitar é a solução

Muito se tem falado sobre reabilitação urbana nos últimos tempos. Que é o motor, o balão de oxigénio, do setor imobiliário nacional. Que ajudará a dinamizar o mercado de arrendamento. Por outro lado, as taxas Euribor têm tocado mínimos históricos e os bancos estão a baixar os spreads cobrados no crédito à habitação, o que faz com que os portugueses, que por norma preferem comprar casa em vez de arrendar, voltem a sonhar com uma casa que seja sua. E agora, o que vai acontecer?

Foi a esta resposta que alguns dos principais intervenientes do setor tentaram responder na conferência “O arrendamento como base de uma sociedade mais dinâmica”, que se realizou dia 14, em Lisboa, no âmbito da II Semana da Reabilitação Urbana, que decorre até domingo, dia 19.  

A ideia é unânime. É preciso apostar e investir mais na reabilitação urbana para promover e dinamizar o mercado de arrendamento

“Nos últimos 25 anos, entre 1987 e 2011, o Estado gastou na habitação 9,6 mil milhões de euros. Desse montante, 73,3% foi em crédito à habitação e apenas 1,7% foi em reabilitação urbana de edifícios”, começo por dizer Vítor Reis, presidente do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana”. Uma ideia sustentada com um estudo realizado pela entidade.

Segundo o mesmo responsável, na reabilitação urbana, Portugal “não foi capaz de realizar um terço dos valores previstos nos vários orçamentos de estado”. “Nos últimos 50 anos, verificou-se uma mudança péssima, no sentido de se investir na habitação própria. Em 1960, mais de 60% das pessoas viviam em casas arrendadas e em 2012 são pouco mais de 20%”, exemplificou.

Para Vítor Reis, “para promover a reabilitação urbana é preciso apostar no mercado de arrendamento e não promover a habitação própria”. O problema é que a maioria das pessoas parece querer alimentar o sonho de querer viver numa casa que seja sua. “Há dias ouvi um jovem dizer que valia mais a pena pedir dinheiro emprestado ao banco para comprar casa que arrendar uma, porque a prestação está mais baixa. Então pergunto: E quem paga depois o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI)? E o condomínio?”.

Já Menezes Leitão, presidente da direção da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), vais mais longe nas críticas. “Para apostar na reabilitação urbana é preciso que haja investimento”, argumentou, salientando que o Regime Excecional de Reabilitação Urbana (RERU), que entrou em vigor há um ano, “devia ser definitivo e não temporário [tem a duração de sete anos]”. 

Uma ideia, de resto, que Ricardo Pedrosa Gomes, vice-presidente da Confederação Portuguesa da Construção e Imobiliário (CPCI), e Fernando Silva, Presidente do Instituto Nacional da Construção e Imobiliário (INCI), desvalorizaram, preferindo enaltecer os pontos positivos diploma. Fernando Silva adiantou, ainda assim, que o RERU deverá ser definitivo, já que o período transitório em causa tem como objetivo testar o próprio diploma.   

Programa reabilitar para arrendar com novidades em breve

No final do ano passado, o secretário de Estado do Ordenamento do Território,Miguel de Castro Neto, anunciou, em entrevista ao idealista/news, que a estratégia do Governo para promover a reabilitação urbana e incentivar o investimento dos privados passa por um quadro legislativo mais ágil e fácil, a par de um pacote financeiro de 1,7 mil milhões de euros.

“Trabalhámos em sede do Portugal 2020 para conseguirmos apoiar em termos financeiros também os privados para fazerem mais operações de reabilitação urbana, além do apoio que já se dava ao setor público (…). Este pacote financeiro vai estar disponível para poder ser utilizado por particulares ou por empresas”, disse. 

Mais recentemente, o ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia.Jorge Moreira da Silva, adiantou, em entrevista ao Jornal de Negócios, que o Executivo está apostado em “continuar o desenvolvimento do mercado do arrendamento”, e que uma das vias para isso “é o Programa Reabilitar para Arrendar em imóveis privados, desde que sejam colocados no mercado para arrendamento”.

De acordo com o governante, o programa arranca com uma disponibilidade de 50 milhões de euros “e já está desenhado”, faltando apenas afinar “alguns formalismos”. 

Vitór Reis, quando questionado sobre este tema, prometeu novidades para breve. “O Programa Reabilitar para Arrendar não está ainda concluído, mas estará em breve”, disse, durante a conferência, salientando que “com o Portugal 2020 vai haver pela primeira vez financiamento para a reabilitação urbana”. 

“2015 é um verdadeiro teste para o mercado de arrendamento”

Ricardo Guimarães, diretor da revista Confidencial Imobiliário, que também marcou presença no evento, não tem dúvidas: “2015 é um verdadeiro teste ao mercado de arrendamento” em Portugal.

Segundo o responsável, o entrave ao arrendamento é mesmo o facto de os bancos estarem de novo mais disponíveis para o crédito à habitação. Os preços dos imóveis subiram 1,2% em 2014, o que aconteceu pela primeira vez desde 2007.

“Os spreads médios no crédito à habitação desceram de 3,7% para 2,9% em 2013. Agora fala-se que os spreads estão abaixo de 2%, mas atenção porque é só para alguns clientes”, revelou. 

Para Ricardo Guimarães, “a taxa média de juros no crédito à habitação ronda os 3%, somando a taxa Euribor e os spreads”, sendo que os empréstimos para a compra de casa subiram “20% entre a primeira e a segunda metade do ano passado”. “Fala-se de reabilitação e arrendamento, mas o mercado está do lado do crédito à habitação”, alertou.

Fonte: Idealista